segunda-feira, 28 de dezembro de 2015

NATAL DE QUEM ?

 Mulheres atarefadas
 Tratam do bacalhau,
 Do peru, das rabanadas.
 - Não esqueças o colorau,
 O azeite e o bolo-rei!
 - Está bem, eu sei!
 - E as garrafas de vinho?
 - Já vão a caminho!
 - Oh mãe, estou pr'a ver
 Que prendas vou ter.
 Que prendas terei?
 - Não sei, não sei...
 Num qualquer lado,
 Esquecido, abandonado,
 O Deus-Menino
 Murmura baixinho:
 -Então e Eu,
 Toda a gente Me esqueceu?

 Senta-se a família
 À volta da mesa.
 Não há sinal da cruz,
 Nem oração ou reza.
 Tilintam copos e talheres.
 Crianças, homens e mulheres
 Em eufórico ambiente.
 Lá fora tão frio,
 Cá dentro tão quente!
 Algures esquecido,
 Ouve-se Jesus dorido:
 - Então e Eu,
 Toda a gente Me esqueceu?

 Rasgam-se embrulhos,
 Admiram-se as prendas,
 Aumentam os barulhos
 Com mais oferendas.
 Amontoam-se sacos e papeis
 Sem regras nem leis.
 E Cristo Menino
 A fazer beicinho:
   - Então e Eu,
 Toda a gente Me esqueceu?

 O sono está a chegar.
 Tantos restos por mesa e chão!
 Cada um vai transportar
 Bem-estar no coração.
 A noite vai terminar
 E o Menino, quase a chorar:
 - Então e Eu,
Toda a gente Me esqueceu?

 Foi a festa do Meu Natal
 E, do princípio ao fim,
 Quem se lembrou de Mim?
 Não tive tecto nem afecto!
 Em tudo, tudo, eu medito
 E pergunto no fechar da luz:
   - Foi este o Natal de Jesus?!!!

(João Coelho dos Santos in Lágrima do Mar - 1996) 
O meu mais belo poema de Natal

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