segunda-feira, 15 de junho de 2020

OPINIÃO ENTREVISTA A PETER SEEWALD

Bento XVI reflete sobre a sua renúncia
P. Andreas Lind, sj
14 Junho 2020

Ficamos a saber que a sua renúncia se compreende apenas no horizonte da fé e da vida espiritual. Não se trata de uma estratégia política ou de uma reação em face de uma Cúria irreformável e corrupta.

Depois da série de quatro longas entrevistas que Joseph Ratzinger, ou Bento XVI, concedeu a Peter Seewald – O Sal da Terra (1996), Deus e o mundo (2000), A Luz do Mundo (2010) e Últimas Conversas (2016) –, o jornalista alemão apresenta agora uma biografia autorizada do Papa emérito. Benedikt XVI. Ein Leben faz, naturalmente, a apologia do Papa emérito (como Massimo Faggioli fez questão de referir), ou não fosse Peter Seewald um jornalista que se converteu ao catolicismo a partir do contacto com a obra de Joseph Ratzinger e a sua pessoa.

Seja como for, este livro com mais de mil páginas tornar-se-á incontornável para quem quiser estudar a vida e o pensamento deste teólogo, deste bispo e pastor, deste Papa (em exercício e emérito). Muito bem documentado, Seewald ajuda-nos a compreender as posições, por vezes polémicas, de Ratzinger em relação ao modo de receber e interpretar o Concílio Vaticano II, a teologia da libertação, o diálogo ecuménico e inter-religioso, o papel das mulheres na sociedade e na Igreja, o relativismo da mentalidade contemporânea…

Sem dúvida, estamos diante de alguém que foi, e permanece, profundamente fiel à Igreja e à fé que professa, ao mesmo tempo que se mantém intelectual e espiritualmente independente. Nesse sentido, Ratzinger mostra-nos o que quis dizer Chesterton ao afirmar que só a Igreja Católica seria capaz de nos livrar da terrível “escravidão” de apenas se ser “filho do tempo” (cf. The Catholic Church and Conversion, chap. V). Esta liberdade ou independência em relação ao tempo manifesta-se, por um lado, na sua capacidade em discordar com a mentalidade em voga, sem deixar que a Igreja se torne, apesar disso, num simples museu de coisas antigas. A mesma liberdade permite-lhe, por outro, introduzir “novidades” na Tradição viva da Igreja e divergir em certa medida, e sempre com respeito obediente, de um Papa como João Paulo II (demonstra-o, a título de exemplo, a sua posição em relação ao célebre Encontro de Assis).

Sem comentários: